quarta-feira, 30 de março de 2022

What's Going On?


Algo tinha acontecido, disso Asa tinha certeza.

Ele pensava isso, enquanto roía as unhas, esperando a diretora chamá-lo para a sua sala.

Certamente, ela tinha mudado e ele era um dos responsáveis por essa mudança, mas nada que...

“Asa, eu não tenho nada pra falar com você.”, disse Elizabeth, enquanto saía da sala acompanhada por uma Tabatha choramingando.

“Mas ela é minha irmã!”, Asa protestou, seguindo a diretora.

“Exatamente, ela é sua irmã, não sua filha.”, falou a diretora dando ênfase nas palavras “irmã” e “filha”.

“Eu me sinto responsável por ela do mesmo jeito.”

“Eu já falei com a sua mãe.”

Droga!

“Ela foi suspensa?”

“Por dois dias.”

“Dois dias? Mas ela é uma criança! Qualquer criança puxa o cabelo da outra. Aposto que a Tabatha provocou.” A menina e a diretora fuzilaram o garoto com os olhos. “Eu só to querendo dizer que a Crystall não é uma pessoa agressiva”.

“Vanessa, você pode levar a Tabatha até o banheiro e lavar o rosto dela?”

“Posso. Vamos, linda!”

“Asa”, Elizabeth se virou para ele, “sua irmã não só puxou o cabelo da Tabatha. Ela disse coisas muito feias também.”

“Crianças chamam a outra de feia, burra.”

“Você sabe que a sua irmã não é como as outras crianças. E outra: ela não chamou a Tabatha de feia ou de burra. Ela falou palavrão.”

Asa bugou. Crystall não falava palavrão.

“Mas a Crystall não fala palavrão.”

“Acontece que dessa vez ela falou.”

“Eu não acredito.”

“Asa, ta nas câmeras.”

Então Crystall realmente havia dito palavrão.

“Asa, aconteceu alguma coisa na casa de vocês? A Crystall ta... diferente.”

Havia acontecido, mas Asa não fazia a menor ideia do que.

“Não que eu saiba.”

“Tudo bem. Eu vou conversar com a sua mãe.”

“Posso falar com ela?”

“Com a sua mãe?”

“Não. Com a Crystall.”

“Melhor não, Asa. Não é porque você é filho de um professor que pode ter regalias aqui.”

“Ok. Eu falo com ela depois.”

“Melhor.”

O garoto saiu derrotado. Crystall estava mais diferente do que o normal. Aquele novo eu dela que as pessoas achavam, Asa já estava acostumado. Essa última versão que agora o assustava.

“E aí?”, perguntou Eric curioso.

Asa balançou a cabeça negativamente.

“Será que o seu pai não consegue descobrir alguma coisa pra você?”

“Acho que não tem o que descobrir. Ela bateu na garota e, pelo que parece, até xingou. O que eu quero descobrir, meu pai nunca vai conseguir. Sem contar que é melhor deixar ele de fora dessas questões que envolvem filhas da minha mãe. Não quero ele com problemas no casamento de novo.”

“Verdade.”

“Quando eu chegar em casa, vou falar com ela.”

“Será que ela vai te falar alguma coisa? Você já tentou outras vezes e ela não falou nada.”

‘Dessa vez eu vou insistir.”

“Sua mãe vai matar ela.”

“Vai.”

As aulas acabaram e Asa voltou para casa. Chegando lá, não viu sua mãe.

‘Rita, onde ta a minha mãe?”

“Ta no quarto dela.”

“E a Crystall?”

“Ta no quarto dela.”

“Elas... brigaram?”

“A briga do século.”

Asa estremeceu.

“Ok.”

“Troca de roupa pra almoçar.”

“Já vou. Valeu, Rita!”

Ele subiu as escadas e foi direto para o quarto de Crystall. Ao abrir a porta, percebeu que ela estava trancada.

“Crystall?”, ele sussurrou. “É o Asa!” Ele sabia que não poderia falar alto, pois se Antonella soubesse que a porta estava trancada, aconteceria a Terceira Guerra Mundial.

“Vai embora!”

“Crystall, por favor, me conta o que aconteceu.”

Silêncio.

“F**k!”, xingou Asa frustrado.

O que tinha feito Crystall ficar tão inquieta? Alguma coisa tinha acontecido. Provavelmente na escola. Asa começou a pensar no dia que pareceu que tudo mudou. Não tinha sido uma mudança gradual. Parecia mais algo de um dia para um outro. Ela começou a ficar agressiva com todos. Com a mãe, com as irmãs, com ele, Rita e, pelo visto, com os colegas. Não, com os amigos. Tabatha era amiga de Crystall. O que será que havia acontecido? Quando foi que ela mudou exatamente? Na quinta passada? Não, foi antes. O dia que ela tinha dado o primeiro grande fora nele foi na quarta, então devia ter sido na própria quarta ou na terça, porque segunda, sim, segunda ela estava normal. Então... E o que Crystall tinha feito na terça e quarta. O celular de Asa tocou.

“Alô.”

“Asa?”

“Quem é?”

‘Mary. Da escola.”

Amiga da Crystall.

Como ela tinha o telefone dele?

“Oi, Mary. Tudo bem?”

“Tudo bem e você?”

“To bem também.”

Silêncio.

“Como ta a Crystall?”

“Não sei. Ela trancou a porta e não ta querendo abrir.”

“Caramba!”

“Mary, você sabe o que aconteceu pra ela ficar assim?”

“Não. Só sei que do nada ela quis sentar separado da gente, começou a dar fora em todo mundo.”

“Sabe quando isso aconteceu?”

“Não.”

Droga!

“Na terça passada ela tava estranha?”

“Não lembro.”

Mary não iria consegui-lo ajudar.

“Então não teve nenhum problema na escola? Talvez com um garoto ou uma amiga?”

“Não. Num dia ela tava bem e no outro se afastou de todo mundo.”

Então o problema não tinha acontecido na escola.

“Ok, Mary. Bem, se eu souber de alguma coisa, falo com você.”

“Ta bom. Você tem meu número?”

“Ta salvo aqui. Vou colocar o seu nome.”

“Obrigada. Um beijo. Diz pra Crystall que eu liguei. Beijo.”

“Tchau!”

Se não tinha sido na escola, então teria que ser algo dentro de casa. Mas nada tinha acontecido lá, não que ele soubesse... O mal de jogar muito videogame... Ela tinha saído naqueles dois dias? Hmmmm... Sim. Pra...

Asa abriu a boca quando se deu conta para onde ela tinha ido.   

Crystall estava agressiva com a mãe, ele, as irmãs, Rita, os amigos.

Não podia ser.

Será?

Asa foi até o quarto da irmã.

“Crystall, pelo amor de Deus, abre essa porta.”

Silêncio.

Asa começou a bater com mais força.

“Eu acho que já sei o que ta acontecendo. Abre a porta, Crystall!”

Silêncio.

Não, não. Será que era aquilo mesmo? Não podia ser! Sua...

A porta se abriu.

“O que você acha que aconteceu?”, Crystall estava com os olhos vermelhos de tanto chorar.

“Crystall, você viu alguma coisa nesses dias? Algo de errado que não deveria estar acontecendo?”

Asa não queria colocar as suspeitas dele em palavras, porque se não fosse nada daquilo, não queria que soubessem sua falta de fé naquela pessoa.

“Vi.”

O coração de Asa começou a bater rápido.

“Era a nossa mãe?”, ele perguntou com cautela.

“Nossa mãe está traindo meu pai com o Calvin!”

Tulipa

Tilipa bateu na porta da sala da diretora, esperando que ela o pedisse para entrar, entretanto nada aconteceu. Ele bateu mais uma vez e ficou sem resposta. Estranhando a situação, entrou na sala e encontrou Elizabeth de cabeça baixa.

“Querida, está tudo bem com você?”

Ela levantou a cabeça lentamente, deu um olhar cansado para o velhinho e respondeu: “Tudo bem sim. Algum problema?”

“Você não me parece bem, querida.”, ele se sentou.

“Eu não dormi direito.”

“Tem certeza?” Tilipa não queria ser entrão, mas acreditava que tinha intimidade suficiente com Elizabeth para poder insistir.

“Sim. Acho que eu to com problema no estômago. Tenho que ir ao médico ver isso.”

“É bom. Qualquer coisa, eu e o James damos uma olhada aqui na escola pra você.”

“Muito obrigada! Mas fala, qual é o problema?”

Tilipa estava explicando algumas questões relacionadas ao Financeiro da escola, quando percebeu que Elizabeth não parecia estar nada bem: “Querida, você está pálida.”, comentou, interrompendo sua explicação.

“Eu só to com uma dor de cabeça e um pouco enjoada.”

O velhinho já havia passado por essa experiência quatro vezes. Só de ver a cara da diretora, já sabia o que estava acontecendo.

“Enjoada?”

“Ti, pode tirar essa ideia da cabeça: eu não to grávida. É enjoo normal mesmo, por causa do estômago.”

Enjoo normal. Sei..., pensou Tilipa.

“Você fez o teste?”

“Eu tomo pílula. E eu não tenho facilidade de engravidar. Will e eu tentamos por três anos.”

“Não sabia disso... Mas talvez quem tenha problema seja o outro, não você.”

“Ele acabou de ter um filho.”

“Não sabia.”

“Pois é.”

“E você? Como ta?”

“Eu to bem. A gente já se divorciou faz um tempo. Já tava na hora de cada um seguir com a sua vida.”

“Lizzie, acho que você ainda assim precisa fazer um teste.”

“Tilipa, sério, não é gravidez. Eu tava menstruada na semana passada.”

“Compreendo... Então você precisa ver esse problema aí. Você não me parece bem.”

“Daqui a pouco eu vou pro médico então.”

“Quantos anos tem o filho do seu ex-marido?”

“Tem semanas.”

“Foi ele que te contou?”

“Eu vi no Facebook.”

“Você sabia que a companheira dele tava grávida?”

“Sabia já.”

“Entendi...”

“É um menino, o nome dele é Elton, o mesmo do pai do Will.”

“Ele sempre quis dar esse nome pra um filho?”

“Não sei, acho que não. Quando a gente era casado, se fosse menino, eu queria que fosse William Jr. Ridículo, não?”

“Não acho não, minha filha. Ridículo seria se fosse William II.

“Ah, isso também não.”

“E se fosse menina?”

“Não sei. Nunca chegamos num acordo. Eu sempre gostei de Maria... Gosto de nome composto também.”

“Se o pai for o Bradley, vai ter que começar com B.”

Elizabeth riu sem humor: “Tem mais alguma coisa em relação ao orçamento que eu precise saber agora? Acho que já vou ao médico.”

“Não, não. Eu te falo depois, quando você estiver melhor.” Tilipa sabia que havia exagerado nas perguntas e que, pela cara de Elizabeth, ela não tinha gostado muito do interrogatório.

“Ok então, Tilipa. Muito obrigada! Vou deixar a escola nos seus cuidados e no do James. Qualquer coisa, me liguem. Avisem aos professores que eu tive que me ausentar.”

“Tudo bem. Aviso ao Bradley que você foi ao médico?”

“Eu mando mensagem.”

“Tudo bem.”

“Ah, e mais uma coisa: fica de olho no Ansel e na Marjorie pra mim?”

“Com certeza!”

Elizabeth saiu da sala, deixando um Tilipa preocupado.

sexta-feira, 25 de março de 2022

Posso contar com você?

Os alunos da turma da Cheryl decidiram se encontrar sexta-feira à noite no Bar do Santana. Alguns dos meninos, incluindo Vincent, estavam bebendo cerveja enquanto jogavam sinuca. Enquanto Hailee, Alison, Tyler, Nico, Cheryl, Nadine, João, Edward, além de alguns outros colegas da turma, estavam numa mesa, a poucos metros de distância, jogando conversa fora. Cheryl estava se sentindo um pouco tonta depois do terceiro copo de chopp. Ela apoiou a cabeça no ombro do namorado e ficou ouvindo a conversa dos colegas, sem prestar muita atenção. 

De repente, a porta do bar se abriu, revelando Ansel. Ele marchou até a mesa dos colegas, olhando fixamente para Cheryl. Os meninos da sinuca pararam de jogar e as pessoas de conversar para observar o garoto. Ansel ignorou os olhares dos curiosos e foi para perto da Geordie.

"Cheryl, preciso falar com você." Ansel falou num tom sério, ainda sem olhar para as pessoas que o encaravam.

Cheryl ergueu a cabeça do ombro do namorado, confusa.

"Comigo?" 

"Sim. Agora." Ansel batia o pé no chão impacientemente.

A britânica olhou para o Edward que estava com uma cara fechada e de novo para Ansel.

"OK." A menina apoiou a mão na mesa para se levantar, com um pouco de dificuldade, e o seguiu para fora.

"Todo mundo tá me tratando como se eu fosse uma m**** de um estuprador. Que p***! Você viu quando eu cheguei? Todo mundo me encarando? Eu não fiz nada, Cheryl! Você me conhece desde que a gente era criança. Você sabe como eu sou. Não sou um monstro. Você acha que eu faria uma coisa dessas com alguém?" Ansel andava de um lado para o outro enquanto proferia sua indignação.

Cheryl se apoiou na parede, se sentindo tonta com o vai-e-vem do amigo. 

"Responde!" Ansel gritou nervoso, se aproximando da menina e colocando uma mão na parede ao lado de seu rosto. 

"Não sei." Ansel arregalou os olhos com a hesitação da Geordie. "Acho que não." Ela respirou fundo. "Eu não tava lá."

"Eu também não estava em muitos lugares em que você foi acusada de ter feito coisas péssimas e, mesmo assim, eu fiquei do seu lado. Eu não só peguei pra mim a sua verdade, mas também defendi ela. Eu sempre fiquei do seu lado em tudo. Até em assuntos que eu nem queria ter me metido."

"Sim, eu sei."

"Agora eu preciso que você faça o mesmo por mim."

"O que você quer que eu faça?" 

"Que você fique do meu lado. Que me defenda. Que diga pra todo mundo que acredita em mim." 

"Eu dizer às pessoas que acredito em você não vai mudar a cabeça delas."

"Você subestima a sua influência."

"Você que não subestima a minha!" A menina retrucou.

Ansel olhou confuso, sem entender o que ela quis dizer.

"Olha, as pessoas te escutam e seguem o que você fala. Se você disser que acredita em mim, automaticamente as pessoas da nossa sala vão começar acreditar também. Você sabe do que eu tô falando. A sua influência querendo ou não ainda é grande. Eu quero que você use ela pra me ajudar."

"Eu não posso fazer isso."

"Por que não?" Ansel perguntou irritado.

"Eu não posso defender um..."

"O quê? Um estuprador?" Ansel socou a parede e Cheryl estremeceu. 

"Não."

"Então o quê?"

"Eu não quero me meter nisso. É sua palavra contra a dela. Eu não tava lá." Cheryl choramingou. 

"Foi consensual!"

"Ela disse que não tava em condições de dizer sim."

"Mentira! Mentira! É claro que tava! O que aconteceu é que ela deu pra mim, se arrependeu e inventou que eu forcei. Você me conhece, Cheryl. Você sabe que eu nunca faria uma coisa dessas. Não é da minha índole. Eu sou uma boa pessoa, p***! Todo mundo sempre disse isso. Agora vem essa filha da p*** me caluniar e vocês acreditam? Eu esperava mais de você." Ansel se afastou e começou a andar com a mão na cabeça. "A minha vida tá um inferno, Cheryl." Ele começou a chorar. "Parece que tudo de bom que eu fiz foi por água abaixo por causa dessa garota."

Cheryl o fitou, confusa. Ele tinha razão. Desde o dia que o conhecera, sempre foi um garoto exemplar. Era difícil acreditar que Ansel seria capaz de cometer estupro. 

"Eu não tô dizendo que eu não acredito em você. É só que... eu de fato fui... você sabe o quê... Eu não me sinto confortável em me posicionar sobre esse assunto. Quando aconteceu comigo, eu fiquei com medo do meu pai não acreditar em mim, e depois, dos policiais não acreditarem. Fiquei com medo deles acharem que, de alguma forma, eu tinha pedido pra aquilo acontecer." Ela enxugou uma lágrima que havia caído no rosto. "Eu não quero dizer que uma mulher está mentindo sobre uma coisa dessas sem realmente saber. Me desculpa, mas eu não tava lá."

"Então você acha que eu posso ter realmente estuprado alguém?"

Cheryl ficou em silêncio, pensativa. 

"Deixa pra lá. Desculpa ter te incomodado." Ansel começou a andar na direção oposta ao bar, indo embora. 

"Espera!" Cheryl gritou e andou com dificuldade até ele. "Eu acredito em você."

"A-credita?" A boca de Ansel tremia de emoção. 

"Sim."

Ansel jogou seus braços em volta do pescoço da Geordie e a abraçou fortemente. "Obrigado." Ele sussurrou em seu ouvido. 

Depois de um tempo a menina se desvencilhou do abraço. "Eu ainda não vou pegar nenhum lado publicamente." Ela disse olhando nos seus olhos. 

"Tudo bem."

"Tá todo mundo estranho com você porque o que aconteceu foi muito recente. Daqui a pouco isso vai cair no esquecimento e tudo vai voltar ao normal."

Ansel assentiu. 

"Até lá, você vai ter em mim uma amiga."

"Eu não quero te colocar numa situação desconfortável. Não precisamos sermos amigos. Até a Chloe me abandonou... Você não tem que ficar."

"Eu quero ficar." 

"Obrigado." Ansel abraçou a menina mais uma vez "Você não sabe o quanto eu sou grato."

"Não precisa agradecer." 

Ansel tirou os braços em volta da Geordie. "Eu vou indo."

"Ok."

"Obrigado mais uma vez."

"Volta com cuidado."

"Você também, se cuida."

Cheryl voltou para dentro do bar e Ansel foi para casa.