terça-feira, 23 de novembro de 2021

Proposta indecente

– Fala. – Disse ele cruzando as pernas.

– Então... – Ela se sentou – É uma proposta de negócios. Uma parceria, na verdade. Não, melhor ainda, uma sociedade.

Ela esperou ele dizer alguma coisa, mas como ele continuou calado a encarando, ela decidiu continuar:

– Andrew, você é um artista.

– Eu sou? – Perguntou ele debochado.

– Escritores não são artistas?

– Bons escritores são artistas.

– E você não é um bom escritor?

– Não sei, to te perguntando.

– Você quer que eu massageie seu ego, é isso? – A italiana revirou os olhos – Sim, Andrew, você é um bom escritor.

– O que você achou do meu último trabalho?

– O livro do pote de mel? Eu achei um dos seus trabalhos mais sensível. É divertido pras crianças e emotivo pros pais. Você acertou dessa vez. Você e o Anthony.

– Você leu?

– Li.

– Sério? Legal. Não sabia.

– Viu? Eu conheço o trabalho das pessoas com quem eu quero fazer sociedade.

– Mas por que dessa vez?

– Dessa vez o quê?

– Você disse que eu acertei dessa vez.

– Ah, sei lá. É que nem sempre você acerta. Seus livros infantis não são ruins, mas tinha uma época que estavam um pouco genéricos, sabe? Mais do mesmo, se eu posso dizer assim.

– Ah é?

– É.

– Hum...

– Te ofendi?

– Não. Gosto de uma crítica sincera, apesar das suas estarem muito vagas.

– Eu posso detalhar mais depois.

– Seria bom.

– Mas voltando ao assunto da sociedade...

– Sim.

– Você é um apoiador das Artes, né? Você entende, consume, produz Arte.

– A mais fina das Artes: a literatura.

– Questionável, mas, sim, sim, você é um escritor e crítico. E eu acho que seria muito vantajoso, na sua posição, investir seu dinheiro em algo voltado pra sua área. Eu já falei que o Calvin fez um acordo com a Prefeitura? Eles também vão investir na galeria. Eles não vão ser sócios, mas esse acordo vai nos trazer mais visibilidade pelos eventos que vamos fazer em parceria com a Prefeitura do Rio. E você pode fazer parte disso, Andrew. Estamos procurando mais sócios e uma das primeiras pessoas que passou na minha cabeça foi você pelo seu envolvimento com as Artes. Eu poderia até fazer uma exposição baseada nos seus escritos, sabe? Não os de literatura infantil, mas os seus romances, os seus contos. Todo esse benefício, sem contar as decisões de escolha, você vai ter se entrar na sociedade. E... Droga! – Antonella se interrompeu ao ouvir Daisy chorando – Só um momentinho, Andrew.

– Tudo bem.

A italiana pegou a bebê que estava no carrinho.

– Calminha, Daisy, calminha. ­– Ela sacudiu levemente a filha – Ela deve ta com fome. Você se incomoda?

– Não, não. Não é nada que eu já não tenha visto... Mães amamentando bebês.

– Claro.

– Depois a Jessica vai ter que amamentar mais dois. Não sei nem como vai ser.

– Éééé. Mas vocês vão dar um jeito.

– Vamos sim.

– Mas então, onde tínhamos parado? Bem, eu tenho uns papéis com as informações da galeria, como estão andando os negócios, pra você dar uma olhada. Eu posso te explicar algumas coisas e...

– Antonella, posso te interromper?

– Pode.

– Olha, eu realmente fico muito grato de você ter pensado em mim nessa ideia de sócios, e sim, eu realmente gosto muito de Arte, você bem sabe disso, mas, assim, a gente já compartilha um filho. Não acho sábio a gente compartilhar um negócio também.

– Mas você não precisa ter um pedaço grande nessa sociedade. Pode ser só uma parte pequena.

– Eu sei, mas eu teria que me envolver de alguma forma, fazer tomada de decisões... Imagina ter uma exposição feita pela minha ex-mulher baseada nas minhas histórias. O que os nossos parceiros achariam disso?

– Mas isso não precisa acontecer, na verdade. Foi só um exemplo, caso você quisesse. Se você quiser ter uma participação mínima ou, até mesmo, nenhuma, ta tudo certo. A gente só te leva o resultado, os lucros, no caso.

– Ainda assim, a Jessica não iria gostar. Pra ela, eu teria arrumado mais uma forma de ficar vinculado a você, entende?

– Não, eu entendo. Perfeitamente. Eu pensei numa relação mais objetiva, de negócios, sabe? Até porque o John também não gostaria da gente muito próximo. O negócio da exposição foi só pra tentar te convencer, na verdade. No final, eu diria que outra artista poderia trazer seu trabalho à vida que não eu. Mas tudo bem, faz sentido. Não custava tentar, né? É o que eu penso.

– Sim, verdade. Eu concordo.

– O Calvin ta procurando sócios também.

– E ele já achou alguém?

– Ainda não, mas começamos agora. É que, no meu caso, é difícil achar alguém que queira investir, sabe? Eu tenho colegas pintores, mas eles não têm muito dinheiro, então... Eu tinha falado até com a Anita, mas ela não tinha o investimento mínimo. Enfim... Vai dar certo.

– Vocês tão no vermelho?

– Sim, mas já era esperado. Negócios só começam a prosperar e dar lucro, no mínimo, com uns três, cinco anos de funcionamento, e a galeria não tem nem um.

– Se for dinheiro que você precisa, eu posso emprestar, mas sem sociedade.

– Não, claro que não.

– Eu realmente não me importo, desde que você devolva.

– Mas aí você sai sem vantagem alguma.

– Se der lucros, você me devolve o dinheiro junto com os lucros que tiver ganhado, se não tiver, você me devolve a quantia que eu dei.

– Não, isso não.

– Bem, fica a oferta. Se você quiser, você me fala, que eu coloco na conta do Asa o dinheiro. Quanto mais ou menos vocês precisam?

– Não, Andrew, deixa pra lá. A oferta já me deixa feliz, muito obrigada! O Calvin tem mais conhecidos, acho que ele vai achar alguém que entre com a gente. Eu te ofereci a oportunidade pela vantagem que isso poderia te trazer, mas se pode gerar um problema no seu casamento, é melhor deixar como está. Mas obrigada mesmo.

– Tem certeza?

– Tenho.

– Ok. – Andrew se levantou – Escritório legal esse o seu. Virou mulher de negócios.

– Foi o Calvin que decorou a maior parte.

– É mesmo?

– Deixa eu te levar até lá fora.

– Não precisa, você ta amamentando a Daisy, e eu sei o caminho.

– Obrigada por levar o Asa ao psicólogo hoje e por ter me escutado. Manda um beijo pra família.

– Mando sim. Manda um pra... Não, esquece, as crianças já estão aqui, então eu mesmo posso dar, e eu definitivamente não quero mandar um beijo pro John.

– Ele vai ficar chateado.

– Ele supera. Tchau, Antonella. Nos falamos...

– Tchau, Andrew.

Obs.: Essa notícia foi traduzida do inglês.

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