sábado, 23 de julho de 2022

Shaving

Bradley costumava ser um dos primeiros a chegar no Cavalinho Feliz porque ia junto com a diretora Elizabeth. Naquele dia, Emma estava com ele e chegou cedo também.

Ela estava a caminho da biblioteca para fazer hora lá, quando esbarrou com Jonathan. Ele estava com espuma de barbear no rosto e uma toalha no ombro.

"Oi. Eu só tava indo buscar outra gillette na sala dos inspetores. Acabei deixando minha mochila lá." Jonathan se explicou meio sem graça.

"Tudo bem. Não julgo. Quer que eu pegue pra você?" Emma ofereceu. "Pra você não ter que andar até lá assim." 

"Ah, eu agradeço. Tá bem no bolso da frente da mochila."

"Tá bom. Já volto."

Emma pegou a gilette e foi até o vestiário dos funcionários.

"Aqui." Emma entregou a gilette.

"Obrigado."

Emma cruzou o alojamento e sentou na bancada onde ficava as pias do banheiro.

Jonathan olhou para a menina confuso.

"Tem problema de eu ficar aqui? Ainda falta um tempão pra começar as aulas e eu tô entediada."

"Não. Nenhum." Ele começou a passar a gilette no rosto.

"Você chega cedo assim todos os dias?" Emma iniciou conversa.

"Chego. É bom que não pego muito trânsito e dá tempo de tomar banho."

"E se barbear." Emma completou.

"E me barbear." Jonathan riu. "Não gosto muito de fazer a barba, mas me falaram que era apropriado pro trabalho."

"Eu gosto da sua barba. Quem falou isso?"

"Minha mãe foi a primeira a falar. Depois outro dia a Jessica falou a mesma coisa."

"Minha dinda te dá muitos conselhos?"

"Não. A gente só se fala nas reuniões de apoio e geralmente é rápido."

"Ela tem dito algo de relevante nessas reuniões?"

"Ela tá mais como ouvinte. Acho que ela nem precisa mais das reuniões. Já conseguiu tudo o que queria."

"E você não?"

"Se eu tivesse conseguido não estaria aqui."

"Você queria trabalhar com o quê?"

"Queria abrir um consultório de psicologia. Mas não é só sobre o trabalho. Eu também queria ter uma família. Uma esposa pra voltar pra casa, filhos..."

"Você ainda pode conseguir essas coisas. Você é muito bonito. As mulheres não dão em cima de você?"

"Não sei. Não sou bom em reparar nessas coisas. Além do mais, sou alcoólatra. Ninguém quer se relacionar com um alcoólatra."

"Tem mulher que não liga."

"Se você conhecer alguma, me apresenta." Jonathan riu. "Posso fazer uma pergunta?"

"Pode."

"Por que você mora na casa da Jessica e não com os seus pais?"

"Ela na verdade é minha mãe."

"A Jessica é sua mãe?" Jonathan perguntou surpreso. 

"Você não acha a gente parecida?"

Jonathan secou o rosto com a toalha, se aproximou da menina e analisou seu rosto.

"Não sei. Quem é o seu pai?"

"O Bradley."

"Que m**** que eles fizeram com a sua vida. Você cresceu achando que era afilhada deles, foi isso?"

"Foi."

Jonathan continuou analisando o rosto da garota.

"A boca."

"Hã?" Emma murmurou confusa.

"Sua boca é da Jessica e as sardas também. O resto todo você puxou do Bradley."

"Você acha a minha boca bonita?"

"Acho. Essa região toda sua é muito bonita." Ele apontou para a área abaixo do nariz da menina. 

"E a de cima é feia?" Emma brincou. 

"Não, não. É muito bonita também. Mas essa é seu ponto forte."

"Tudo bem. Obrigada."

"Olhando bem, você é muito bonita mesmo. Não tinha reparado antes."

"Ouch."

"Não. Não é porque você não chamou atenção. É porque todas as poucas vezes que te vi, eu tava muito nervoso."

"Muito nervoso pra reparar em mim?" 

"Sim. Sua mãe me deixa nervoso. E o marido dela também. Tenho a impressão que eles tão sempre me julgando."

"Acho que não."

"Talvez não o Andrew. Ele foi muito legal me arrumando esse emprego. Acho que julguei ele errado."

"Você achava o que dele?"

"Achava ele meio arrogante."

"Ele é meio arrogante." Emma riu. 

"Não acho mais. Foi muito generoso o que ele e a diretora da escola tão fazendo por mim."

"Verdade. Eles são boas pessoas."

O alarme do celular do Jonathan tocou. 

"Tá quase na hora de abrir a escola. Nos falamos depois?" 

"Sim." Emma desceu da bancada. 

"Foi um prazer finalmente falar com você." Ele estendeu a mão. 

"Igualmente. Bom trabalho."

"Boa aula." Ele recolheu seus pertences, colocou seu jaleco e foi para a entrada da escola. 

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