quarta-feira, 27 de março de 2024

Dia da mulher

George encerrou a ligação, pensando em como iria proceder em relação àquela notícia. Ele pegou um expresso da requintada máquina de café que ficava dentro de seu escritório enquanto ponderava seu dilema. O advogado sabia que ela não negaria. Seu amor pela sua filha, Rose, era incontestável. Entretanto, será que aquele inocente gesto poderia vir a se tornar uma munição a ser usada contra a ruiva no futuro pelo seu marido? 

Apesar de não gostar do homem que Jessica escolheu como marido, George respeitava seu casamento, e sabia que a felicidade da ruiva estava atrelada, parcialmente, ao sucesso de sua união. Ele não gostaria de ser motivo para alguma discussão conjugal dos dois, mas sua filha já tinha passado por tanta coisa, e tão nova, que faria tudo o que estivesse ao seu alcance para protegê-la de qualquer dessabor.

O advogado se levantou e foi até a sala da ruiva.

"Pode entrar." Jessica falou sarcástica ao ver o amigo entrando na sua sala sem bater a porta.

"Em minha defesa, eu perguntei antes pra secretária se você tava em reunião." George se justificou, com um sorriso presunçoso no rosto.

"Aham." Jessica preferiu não perder tempo lecionando que bater na porta era também uma questão de educação, porque estaria se repetindo pela milésima vez.

"Na escola dos seus filhos vai ter alguma coisa sobre o dia da mulher?" George perguntou, sentando na cadeira oposta a ela.

"Acho que não. Talvez eles distribuam flores para as mulheres na hora de buscar as crianças. Por quê? Tá querendo uma flor? Posso arrumar uma pra você."

"Ha. Muito engraçado. É que na escola da minha filha vai ter uma homenagem às mulheres. Coisa simples. Vai ser só algumas crianças lendo e recitando poesias. A Rose vai ser uma delas.”

“Que legal! Vou pedir pra ela recitar pra mim da próxima vez que eu buscar ela da escola.”

“Eu nem sei se a Rose vai querer recitar hoje. Não tem ninguém pra assistir ela.”

"Não? E a sua mãe?"

"Tá passando mal desde ontem. Ela ficou de ver se amanhecia melhor hoje pra ir, só que ela acabou de me ligar dizendo que não vai dar."

"O que ela tem?" Jessica perguntou preocupada.

"Enxaqueca. Ela tem desde nova, então não é nada preocupante, só bem incômodo."

"Se é assim, eu vou no lugar da sua mãe ver a florzinha." A ruiva ofereceu.

George sorriu. Ele nem precisou pedir. Jessica nunca decepcionava.

"Obrigado. Eu tava preocupado que a Rose fosse ficar sozinha e triste vendo as outras crianças com as mães, avós, tias... Eu quase não mandei ela pra escola hoje por causa disso."

"Sempre que sua mãe não puder fazer essas coisas relacionadas a Rose, eu faço com o maior prazer. Você só vai ter que atender meu cliente das 11:30."

"Tudo bem. Só me passar a ficha dele." George levantou da cadeira.

"Vou pedir pra Jaque levar pra você."

"Fico te devendo uma." George deu um tapinha na mesa da ruiva e deixou sua sala.

Quando chegou perto do horário da saída da Rose, Jessica foi até a escola da menina.

"Jessica! Que bom que você veio! A Rose não para de chorar dizendo que ninguém viria. Vem comigo que eu te levo até ela."

A inspetora guiou a ruiva até a filha de George. 

Jessica observou cheia de dó a menina em prantos. 

"Florzinha." Jessica chamou a criança.

Rose procurou com o olhar de onde vinha a voz da ruiva, e então, correu para os seus braços. 

“Meu amor! Por que você tá chorando?” A advogada se agachou para ficar do tamanho da menina. “Hein?” Ela secou suas lágrimas com a mão. 

“Porque só eu que não tenho ninguém.” Rose falou soluçando. 

“E eu? Eu sou ninguém?” Jessica fingiu tá ofendida. 

“Não.” Rose balançou a cabeça ainda chorando. 

“Minha lindinha.” A ruiva abraçou a menina. “A tia não gosta de te ver chorando.”

Rose não respondeu e continuou chorando nos braços da ruiva. Jessica pegou a menina no colo e se virou para a inspetora. 

“A apresentação vai ser que horas? Ela tá muito nervosa.” A advogada perguntou. 

A inspetora olhou para o relógio. “Daqui a 15 minutos.” Ela acariciou as costas da menina. “Se acalma. Você já tá com a sua tia.”

“Você se importa de pegar um copo d’água?” Jessica pediu a mulher. 

“Claro que não. Já volto.” A inspetora saiu. 

Jessica sentou num banco que estava próximo e colocou a Rose sentada no seu colo. 

“Por que você tá assim, minha florzinha? Você queria que sua vó tivesse vindo?”

“É que eu pensei que ninguém vinha.” Rose respondeu. 

“Mas eu não tô aqui?”

Rose assentiu. 

“Então! Eu vim aqui porque eu tô louca pra ver você se apresentar. Me contaram que você decorou uma poesia bem bonita, é verdade?"

"É." Rose sorriu entre as lágrimas. "É pro dia da mulher."

"Eu sei que é pro dia da mulher." Jessica fez cosquinha na menina.

A inspetora voltou com a água. 

“Obrigada.” Jessica agradeceu e deu a água na boca da menina. “Tá todo mundo ansioso pra te ver apresentar.”

“Verdade?” Rose perguntou com os olhos brilhando. 

“Claro que é. Não é Mônica?” Jessica perguntou para a inspetora. 

“Super ansiosos.” A inspetora confirmou. 

“Tá vendo?” Jessica afastou o cabelo da menina do rosto. “Seu pai ainda me pediu pra filmar você porque ele tá doido pra ver você também.”

"Vamos, Rose, se preparar pra apresentação?“ a inspetora perguntou para a menina.  “Sua tia vai tá bem na plateia pra ver você."

"Tá bom." Rose concordou. 

"Dá beijo." Jessica pediu para a menina que deu um beijo em sua bochecha.

"Diz pra sua tia: Até logo, tia!" A inspetora falou enquanto segurava a mão de Rose, para levá-la para se preparar. 

"Até logo, tia." Rose repetiu e acenou. 

“Até logo, florzinha!” Jessica acenou de volta. 

Na apresentação Rose ao entrar no palco procurou sua tia com os olhos. Jessica acenou e mandou beijos. A menina sorriu e começou a recitar o poema. Ela falou o poema direitinho, sem esquecer nenhuma palavra, e ganhou uma rodada de aplausos de todos, e de forma ainda mais enérgica, da sua tia, que além de aplaudir, assoviou e gritou o nome da menina toda orgulhosa. 

Ao término, Rose correu para o colo da ruiva. 

“Você foi incrível!” Jessica falou realmente impressionada. 

“Você ficou batendo palma o maior tempão.” Rose riu. 

“Eu não resisti. Tava tão orgulhosa dessa minha florzinha mais bonita do meu jardim.” Jessica encheu a menina de beijos e ela começou a gargalhar.  “Agora, podemos ir?”

“Podemos!”

“Eu liguei pro seu pai e disse que ia almoçar com você antes de te levar pra casa. O que você acha?” Jessica perguntou saindo da escola com a menina no colo, a mochila de unicórnio no ombro, e a lancheira e a chave do carro na mão. 

“Eeeeee!” Rose comemorou. “Posso comer batata frita?”

“Só se você colocar uma salada no prato.”

Rose ponderou o que a tia dissera. “Pode ser alface e tomate?”

“Pode.”

Jessica abriu a porta detrás do carro, colocou as coisas da menina no banco e prendeu a menina no cinto de três pontos que usava nos filhos. 

“Tô muito orgulhosa de você, minha pequena.” Jessica falou mais uma vez, depois de verificar que a menina estava bem presa. 

Rose abriu o maior sorriso. Jessica sorriu de volta e beijou sua cabeça. “Agora vamos almoçar?”

“Vamos! Minha barriga tá roncando!”

Jessica gargalhou. “Então vamos logo!”

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