terça-feira, 1 de setembro de 2020

Enjoos

"Eu comprei um vestido tão bonito pra você ir." Jessica tentou convencer sua afilhada. Ela estacionou o carro e saiu.

"Eu nem conheço a garota!" Emma contra-argumentou.

"Vocês chegaram a brincar juntas quando você era pequena." Jessica estava caminhando e parou de andar, de repente.

"Que foi?" Emma parou abruptamente e segurou a cintura da madrinha que tentava se manter em pé com dificuldade.

"Nada. Só minha pressão que baixou um pouco." Jessica fixou o olhar na afilhada, esperando que sua imagem não ficasse tão fora do foco.

"Acho melhor a gente ir pro médico." Emma disse preocupada, sem soltar a madrinha.

"Não precisa. Minha pressão abaixou porque eu não comi nada até agora, mas já tô me sentindo melhor."

"Você não pode passar a manhã inteira sem comer nada." Emma soltou a cintura da sua dinda e ofereceu sua mão a ela. Jessica segurou e as duas andaram em direção ao restaurante.

"Eu sei. Eu acordei atrasada e saí correndo." Jessica mentiu. 

***

"Eu to com dificuldade em decorar todas aquelas falas." Emma pegou mais uma garfada de comida e colocou na boca. 

"Romeu, Romeu? Por que és Romeu? Renega teu pai e abdica de teu nome; ou se não o quiseres, jura me amar e não serei mais um Capuleto. Teu nome apenas é meu inimigo. Tu não és um Montecchio, és tu mesmo. Ó! Sê algum outro nome! O que há num nome? O que chamamos uma rosa teria o mesmo perfume sob outro nome. Romeu, renuncia a teu nome; e em lugar deste nome, que não faz parte de ti, toma-me toda!"Jessica falou todo o texto de cabeça.

"Você sabe as falas?" Emma perguntou boquiaberta.

"Algumas. Romeu e Julieta era o meu livro preferido quando mais nova." Jessica disse como se não fosse nada demais. Ela remexeu a comida no prato não conseguindo colocar praticamente nada para dentro.

"Uau. Você pode me ajudar com as falas?" Emma perguntou impressionada.

"Claro, meu amor. Vai ser um prazer." Jessica sorriu para a afilhada. A advogada não podia deixar de sentir orgulho de saber que sua Emminha interpretaria a Julieta. 

A ruiva voltou sua atenção à comida e foi tomada por uma ânsia de vômito. "Já volto." Ela levantou e foi depressa ao banheiro. A ruiva entrou numa cabine e vomitou tudo o que tinha no seu estômago, tentando ao máximo tirar seu cabelo da frente. Depois ela deu descarga, lavou a boca e voltou à mesa. 

"Tá tudo bem?" Emma perguntou quando viu sua dinda de volta. 

"Sim. Meu celular vibrou e era uma ligação importante." Jessica mentiu. "Mas continua falando da peça."

Emma voltou a falar e Jessica tentou prestar atenção, porém sua cabeça já estava em outro lugar. Ela não conseguia pensar como seria aquilo possível se ela utilizava todos os métodos contraceptivos. A ruiva lembrou da vez que passou mal durante o café da manhã e vomitou tudo o que havia comido, provavelmente a pílula também. 

Jessica levou sua afilhada para a casa do Bradley e voltou para o escritório. Quando chegou, já tinham clientes esperando por ela. 

"Eu já começo a atender vocês." Jessica disse a seus clientes, que acenaram com a cabeça. 

"Manda o primeiro entrar daqui a vinte minutos." Jessica disse a sua secretária. 

"Ta bom. A senhora tá bem? Sua cara tá mais branca do que a de um fantasma!" Paty informou chocada. 

"Eu já sei que eu sou muito branca." Jessica retrucou dando as costas. 

"Não foi isso que eu quis dizer." Paty disse nervosa. 

Jessica não respondeu e foi para sua sala. 

Quando a ruiva entrou ela sentou na cadeira e apoiou a cabeça nas duas mãos. 

Essa era a coisa que ela menos queria. A ruiva pegou o celular e discou o número da madrinha. 

"Alô." Octavia disse da outra linha. 

"Oi, dinda." Jessica falou tentando conter a emoção. 

"O que foi, filha?" 

"Eu acho que eu tô grávida." Jessica disse com a voz embargada. 

"Por que você acha isso?" Octavia perguntou calmamente. 

"Porque eu fiquei tonta e não consegui comer nada no almoço. Eu to enjoada até agora."

"Sua menstruação também tá atrasada?" 

"Aham." Jessica não tinha se dado conta disso antes, agora que sua madrinha trouxera a questão da menstruação à tona, ela tinha praticamente certeza de que estava grávida. Jessica começou a chorar. 

"Calma, filha. Isso não é o fim do mundo." Octavia tentou consolá-la. 

Jessica não respondeu, ela continuou a chorando pensando em como lidaria com aquilo. 

"A gente tem que marcar uma consulta pra você." Octavia falou sendo a voz da razão. 

"Eu sei." Jessica enxugou as lágrimas. 

"Eu tô indo pra sua casa ficar com você."

"Obrigada." Jessica esperava que a madrinha dissesse isso. E era o que ela queria. A advogada não conseguia imaginar lidar com aquilo sozinha. 

"Filha?" 

"Oi."

"E o pai da criança?" 

"Não tem nenhum pai da criança porque não vai ter criança!" Jessica despejou com raiva. 

"Ok. Tudo bem. Te vejo mais tarde e vê se marca essa consulta pra amanhã." Octavia falou com sua calma de sempre. 

"Ta bom." 

Jessica desligou o telefone, lavou o rosto e voltou ao trabalho.

No intervalo do expediente a advogada foi ao banheiro. Quando desceu a calcinha, ela viu sangue. Jessica fechou os olhos e agradeceu aos céus. 

Ela pegou o telefone e digitou uma mensagem à madrinha:

Alarme falso!!!

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