sexta-feira, 17 de julho de 2020

Na madruga boladona

Andrew acordou sobressaltado. Ele olhou para o relógio e viu que ainda eram 3h21min. Do seu lado, Jessica dormia tranquilamente.
O inglês fechou o olho e tentou dormir novamente em vão. O pesadelo que teve não saía da sua cabeça. Katie. Como ele havia sido um idiota. Não só no término, mas no relacionamento como um todo. Isso o atormentava mais do que ele gostaria de admitir. Ele já tinha sido babaca outras vezes e isso até o incomodou um pouco, mas no caso da morena aquilo, literalmente, o fazia perder o sono. Não era a primeira vez que do nada isso passava por sua cabeça. Uma vez, quando estava no carro a caminho do trabalho, tocou She Will Be Loved e o sofrimento começou. Teve outra vez, em casa, que ele estava lavando a louça, se lembrou da Katie e mais uma vez se sentiu mal. Na escola, nem se falava! Ele evitava olhar para a garota.


O professor queria se desculpar, mas não sabia o que falar. Qualquer desculpa parecia insuficiente. Para ele, ela nunca o perdoaria. Andrew até conseguia visualizar a cena: ele pediria desculpas, ela o ouviria séria, diria que já passou e seguiria com raiva dele. De que forma o que ele falasse poderia chamar a atenção dela?


Ele poderia ser sincero. Poderia começar dizendo que ele havia sido um idiota e que a sua intenção nunca foi machucá-la. Poderia dizer que ela era muito importante para ele, por mais que ela duvidasse. E de fato, era. Quando Andrew se divorciou, tudo se tornou amargo para ele. Qualquer coisa o irritava, mais do que agora. Ele tentou outros relacionamentos, mas nenhum dava certo, porque ele realmente não conseguia se interessar por nenhuma outra. Isso só mudou com a Katie. Desde a primeira aula provocativa. Não foi paixão a primeira vista. Na verdade, foi um processo, mas qualquer que tenha sido a tática da Katie, deu muito certo. Quando se deu conta, ele não parava de pensar nela. O inglês odiava a turma dela, mas ao mesmo tempo torcia para chegar a hora de dar aula lá só para vê-la. Ele torcia para ela mexer com ele, mesmo que aquele sentimento todo fosse errado. Por que era errado mesmo? Ele não lembrava. De qualquer forma, o professor gostava da audácia dele. Como docente, ele sempre tinha que censurá-la, colocá-la para fora de sala, mas por dentro, ele queria que ela falasse mais, provocasse mais. Quando ela um dia reclamou para não sei quem que ele sempre chegava irritado e descontava qualquer coisa que desse errado no dia dele nos alunos, Andrew se sentiu traído. Muito porque ele não esperava um relato desse vindo dela, mas também porque, muitas vezes, ela era quem trazia seu bom humor. Ele sentia que mostrava isso, mas pelo visto era só uma percepção sua. Só que a Katie voltou atrás. Ela não só o defendeu, mas também salvou seu emprego.


Andrew também se lembrava de quando ela disse que tinha vontade de estudar Letras e Inglês, mesmo sabendo que no fundo não conseguiria, por causa do monopólio construído pelo pai. Isso o deixou tão feliz. Katie já elogiou o seu cheiro, comprou uma vela, colocou Maroon 5 para tocar, o chamou de Woody... Nossa, que idiota!


Com a Katie tudo tinha sido mais impactante, porque de alguma forma era errado. Quando as coisas começaram com a outra não teve essa carga, apesar de haver alguns revés. Aliás, ele se lembrava da primeira vez que havia feito sexo com a Katie. Foi na escola e ele estava com tanta vontade que ficou com medo de machucá-la.


Durante mais ou menos dois anos, quase três, Andrew foi devoto à Katie. Ela mostrou a ele que ainda havia esperança depois do divórcio. Alguém poderia atraí-lo sim. Foi a chave de entrada para as outras, porque ela aturou suas piores partes e sua fase mais difícil.


Ele queria dizer tudo isso à morena. Queria dizer que ela ainda era importante para ele e que ele se sentia muito culpado, que ela não merecia aquilo, que, na verdade, ela merecia muito mais dos amigos e dos exs e do pai. E que ele ainda gostava do cheiro de Natura dela. E que ela ainda tinha uma cara de bebê, sem o lado creepy da frase. Ele só queria agradecê-la e pedir desculpas por tudo. Mas ele não tinha coragem. Ela não iria acreditar. Às vezes o final amargo contamina a trajetória.


Andrew fechou os olhos mais uma vez tentando dormir. Ele, como das outras vezes, pediu perdão mentalmente. No final, ele sabia que mesmo que ela genuinamente o perdoasse, essa paz de espírito nunca retornaria. Por quê? Era melhor voltar a dormir...

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