quinta-feira, 6 de abril de 2023

Era para ser do especial, mas não quiseram colaborar...

            Asa sentou no banco após ter sido retirado do treino por não estar conseguindo defender nenhuma bola até então. Ao contrário dos colegas, ele não se sentia mal por ficar no banco. Para falar a verdade, sentia-se bem apático.

– Bem-vindo ao mundo dos meros mortais. – Disse Bela, que estava no banco. Ela sempre ficava no banco.

Asa continuou olhando para a partida que acontecia, sem realmente reparar nas coisas.

– Está chateado?

– Por que eu estaria chateado?

– De ficar no banco, ora bolas!

– O que significa “ora bolas”?

Bela sorriu condescendente para ele.

– Não quer falar, não quer falar.

Asa tinha muita dificuldade de entender Bela. Além do sotaque paulista, ela usava expressões muito estranhas.

– Eu não ligo de ficar no banco.

– “Eu não ligo de ficar no banco”, disse Asa, que odiava ficar no banco. – Ela sorriu mais uma vez, mas Asa a ignorou, então ela voltou a olhar para o jogo.

Nathan estava dando o seu melhor no gol para conseguir seu lugar como goleiro oficial do time de volta e estava se saindo muito bem. Bela olhava de vez em quando de soslaio para Asa com o intuito de ver como o garoto estava se sentindo, mas ele não demonstrava nenhuma reação. Na verdade, parecia nem estar prestando atenção no jogo.

 Ela não deveria falar. Ela sabe que não deveria falar. Ela havia prometido a Eric que não falaria.

– Emma. Você está pensando nela.

– Não estou.

– Você está triste porque ela engravidou...

– Eu não quero ser mais um capítulo daquele especial do blog.

– Então você está triste!

– Eu tenho outras coisas na minha cabeça. Não tenho tempo para pensar no que está acontecendo na vida de outras pessoas.

– Não quer falar, não quer falar.

– Estou pensando na mudança.

– Você tinha dito na escola que não tinha sido tão ruim.

– Eu menti.

– Sua madrasta fez alguma coisa?

– Eu não me sinto à vontade naquela casa nem com aquela família. Lá eu sempre me sinto deslocado, bobão, intruso e desconfortável. Não queria ter deixado a minha família.

– Aquela também é a sua família.

– Eu não me sinto assim.

Bela ficou quieta, olhando para Asa, que continuava olhando para frente.

– Desculpa por estar chato. Mais chato do que o de costume.

– Você vai se acostumar com a situação. No começo vai ser difícil, mas depois vai ser como se você sempre tivesse vivido naquela casa.

– Eu sei. Mas isso não significa que eu não vou continuar achando aquela casa chata, porque aquela casa é muito chata. Parece que todo dia é a mesma coisa. Todo mundo é muito caricato. Meu pai é o tiozão, estressadinho e bobão, a Jessica é a tiazona reclamona, mãe de todos, nojenta, a Mel é a maluca, o Levi é o metidão, o Theo é o sensível copycat, a Emma, quando está, é a estranha, sem noção, a Zendaya é coração e eu sou o chato, insuportável e estranho. Só a Sadie que ainda não entrou no pacote...

– E o filho da Emma. Acho que essa dinâmica vai mudar bastante quando o bebê nascer...

Asa ficou em silêncio.

– Você ainda gosta dela?

– Não. Faz tempo que eu não gosto dela.

– Entendi.

– Desculpa pela reclamação.

– Ninguém é mais reclamone do que eu.

– Eu não acho você reclamona. Uma pessoa reclamona. - Asa se corrigiu.

– Não? – Ela riu.

– Suas reclamações são todas... Esqueci a palavra, mas são todas... Você tem o direito de fazer as suas reclamações. Elas fazem sentido.

– Eu acho que vou sair do futebol. Cansei de ficar no banco.

Asa franziu a testa e ficou quieto. Bela voltou a olhar para a partida. Pouco tempo depois, o garoto disse:

– Queria que você não saísse.

– Também, mas ninguém me leva a sério.

– Eles que perdem.

– Com certeza! Eu sou muito boe. Melhor do que todos aqui!

– Nisso eu não tenho do que discordar.

Bela sorriu.

– Melhor do que você!

– Você nem é goleiro.

– Mas se eu fosse, seria melhor do que você.

– Nem você acredita nisso.

Ela sorriu mais uma vez e virou o rosto em direção ao jogo.

– Não quer falar, não quer falar.

– Não é assim que funciona!

– E quem disse isso?

– Hã? Meu, você é maluco!

– Não gostou, não gostou.

– Você está me zoando?

– Claro que não!

– Porque se você estiver me zoando, eu posso te zoar muito mais.

– Não duvido disso.

– Então não me provoque!

– Eu estou recuando.

– Ótimo!

– Ótimo.

E os dois voltaram a sua atenção para o treino mais uma vez.

Aparentemente.

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