quarta-feira, 5 de abril de 2023

Especial: O que esperar quando você está esperando - Capítulo VIII: A oração

Quando era muito criança, Guilherme acreditava que um dia se casaria com Luciana.

Ele tinha tanta certeza disso que quando imaginava seu futuro, ela sempre estava lá. Quando Lana chegou na escola, ele achou a menina tão encantadora, que se revoltou com o seu destino, até se dar conta que poderia namorar outras meninas antes de casar com a Ferreira do Mar.

O futuro com Luciana, acima de tudo, lhe dava paz de espírito. Enquanto a maioria das pessoas, não tinha noção alguma do que iria acontecer anos a frente, Guilherme já tinha tudo mapeado. Até reparar em Emma.

Emma sempre fez parte da sua igreja e seus pais eram amigos de Jessica, não muito de Bradley, pois o professor de estatísca era muito reservado. Guilherme chegou a ir a todas as festinhas de aniversário da menina e ela às suas. Entretanto, eles não se falavam. Emma parecia ser uma criança estranha e sempre estava cercada de seus pais ou seus padrinhos, motivo qual, Guilherme não fazia questão de falar com a menina.

Conforme foi entrando na adolescência, muitos de seus amigos da igreja começaram a ter uma quedinha por Emma. Parecia até uma epidemia, onde ele e mais alguns poucos ainda não tinham sido atingidos, e que a cada semana, um garoto novo era contagiado. 

Guilherme se sentia imune a beleza da menina, até porque ele estudava no Cavalinho Feliz, onde basicamente todas as garotas eram puras beldades.

Tudo mudou no dia que Jessica foi até sua casa visitar sua mãe e levou Emma consigo.

Guilherme estava jogando video game no quarto e desceu para pegar uma coisa para comer. Emma estava lendo um livro no sofá ao lado da madrinha. 

Ele abriu a geladeira e pegou uma jarra de suco. Depois foi até o balcão, colocou o suco no copo e começou a beber. O menino deu um pulo para trás quando Emma se aproximou pelas suas costas. 

"Desculpa ter te assustado. Sua mãe pediu pra eu levar o resto dos sanduíches pra sala. Você sabe onde tá?" 

Ele não lembrava de já ter olhado a menina de tão perto assim. Naquele momento, Guilherme sentiu seu corpo sendo infectado pela doença dos amigos. 

"Hã, dentro da geladeira." Guilherme engoliu em seco. 

"Obrigada." Emma foi até a geladeira. "Vai fazer o que nas férias?" A menina perguntou casualmente. 

"Vou pra a Austrália surfar com o meu pai." Guilherme respondeu, observando atentamente a loira. 

"Não sabia que você surfava."

Ela sabe alguma coisa sobre mim? Será que já perguntou de mim pra alguém? 

"Eu tento. Não sou muito bom." Guilherme admitiu. "E você? O que vai fazer nas férias?" 

"Vou pra um curso de verão de química molecular." Emma levou a bandeja de sanduíches para o balcão. 

"É sério? Você vai estudar nas férias?" Guilherme perguntou perplexo. 

"É melhor do que ficar em casa olhando pro teto."

"Por que você não viaja?" 

"Porque meus pais não vão tá de férias e não posso viajar sem eles."

"E aí você prefere estudar?" 

Emma riu. "É muito estranho?" 

"Um pouco." Guilherme riu junto. 

Quando a risada cessou, veio o silêncio constrangedor. 

"Vou levar os sanduíches pra sala. Foi bom falar com você." Emma pegou a bandeja. 

"Você gosta de video game?" Guilherme perguntou quando a menina estava perto da saída. 

"Depende do jogo."

"Eu tenho vários jogos no meu quarto. Você quer jogar comigo?" Guilherme perguntou tentando prolongar ao máximo o seu momento com a Emma. 

"Quero."

Depois daquele dia, Guilherme nunca mais conseguiu se ver com outra garota que não fosse a loira.

Descobrir que Emma estava grávida foi um golpe no estômago. Corrigindo, um golpe no estômago doeria menos do que a gravidez da menina. E para piorar, o filho era de Channing, a pessoa que ele mais odiava no mundo. Imaginar Emma com um bebê com a cara babaca de Channing e aqueles músculos toscos dentro dela era pior do que assistir a um filme de David Cronenberg. Ele queria que aquela aberração morresse. 

Guilherme estava bravo, mas acima de tudo, decepcionado e triste. Agora todos os planos que tinha para o futuro foram por água abaixo. O amor da sua vida tinha escapulido de suas mãos e não havia mais nada a fazer. O menino não conseguia nem ao menos falar com ela. Doía demais. 

Certo domingo, na igreja, Emma o olhou com expectativa que lhe dirigisse a palavra, porém ele ignorou seus olhos pedintes. Dava para ver que a menina estava carente e assustada, mas Guilherme não podia ceder. Ele tinha que ser forte e passar a mensagem que nunca apoiaria aquela gravidez, e por conta daquele erro, ela o havia perdido para sempre. 

Guilherme estava totalmente decidido até ver Bradley segurando a menina quase desacordada pelos braços, perto da saída da igreja. 

"Tá tudo bem com ela?" Guilherme perguntou ao Bradley. 

"Ela tá tonta. Você pode ficar com ela enquanto eu corro pra farmácia?" Bradley falou nervoso. 

"Claro." 

"Vou só colocar ela sentada lá dentro." 

"Eu ajudo." Guilherme ofereceu. 

Eles guiaram a menina para dentro e colocaram ela sentada no banco. 

"Vou pegar um remédio pra você e já volto." Bradley avisou a menina e saiu. 

"Tá muito ruim?" Guilherme perguntou para a sua ex. 

"Aham." Emma respondeu com os olhos fechados. 

Guilherme sentou do seu lado. "Apoia a cabeça no meu ombro. Vai ajudar na estabilidade." 

Emma levantou a cabeça com dificuldade e Guilherme ajudou a menina a descansar no seu ombro.

"Obrigada." Emma falou ainda de olhos fechados. 

"Tá tendo muito isso?" 

"Às vezes. Mas na maioria das vezes é rápido."

"Você sempre tem que tá com alguém por perto. Imagina se isso acontece na rua e você tá sozinha?" 

"Verdade." Emma concordou. 

O reverendo passou perto dos dois e parou para cumprimentá-los. 

"Vocês voltaram?" O reverendo perguntou sorrindo. 

"Não. Ela tá passando mal." Guilherme respondeu. 

"Pobrezinha. Tá com o quê?" 

"Uma virose." Guilherme não gostava de mentir na igreja, mas por Emma, ele abriria uma exceção. "O Bradley foi comprar um remédio pra ela tomar."

"Tem mesmo uma virose circulando por aí que todo mundo tá pegando. Fica bem, Emminha. Vou tá orando por você."

"Obrigada."

"Se cuida, viu?" 

O reverendo saiu. 

"Você tá tremendo." Guilherme esfregou seu braço. 

"Eu tô com frio." Emma se encolheu do seu lado. 

Guilherme continuou esfregando o braço da menina e iniciou uma oração silenciosa. 

Pai, cuida da Emma e do bebê dela. 

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