quarta-feira, 16 de dezembro de 2020

Assinatura

Octavia estava preparando seu famoso frango com quiabo, comida que Paulo adorava e sempre pedia para ela fazer, quando o interfone tocou.

"Jessica! Aquele cara seboso tá aqui!" Octavia gritou da cozinha.

Jessica tinha acabado de sair do banho e estava penteando seu longo cabelo ruivo na frente do espelho. Ela vestia somente seu roupão de banho e um par de havaianas. Abriu a porta do banheiro, apenas o suficiente para ver sua madrinha na cozinha e seu pai no sofá com um jornal na mão. 

"Que cara seboso? George?" A advogada perguntou da porta do banheiro.

"Eu já chamei outro conhecido seu assim?"

"Deixa eu ver. O Miles, o Fernando, o Igor..." A ruiva enumerou.

"Nem lembro desses caras, mas sim, é o George." Octavia gesticulou com uma colher de pau. 

"Ele disse que viria amanhã!"

"Vai logo colocar uma roupa porque eu não quero ficar muito tempo criando conversa com ele não."

"Eu entretenho ele. Não sei porque a implicância com o rapaz. Ele é um excelente advogado e é bastante educado também." Paulo se intrometeu. 

"Eu odeio quando aparecem de surpresa! Agora vou ter que receber ele de cabelo molhado." Jessica caminhos para seu quarto resmungando e fechou a porta.

Campainha.

"Pode deixar que eu atendo." Paulo dobrou o jornal com cuidado e foi até a porta.

"Paulo! Você por aqui!" George apertou a mão do pai de Jessica e deu um abraço.

"Eu, por aqui." Paulo retribuiu o gesto de George com alguns tapinhas nas costas do advogado. "Pode entrar, a Jessica tá terminando de se trocar."

George entrou no apartamento e parou no meio da sala.

"Tavinha!" George chamou, brincalhão.

"Tô ocupada."

"Percebi. Qual é o grande prato de hoje? Sinto cheiro de frango."

"Frango com quiabo." Octavia respondeu seca.

"E você tá convidado pra almoçar com a gente. O frango com quiabo da Octavia é sublime."

"Bem que eu gostaria, mas eu tô com horário. Era pra eu vir amanhã, mas o juiz tá em cima de mim querendo alguns ofícios prontos pra ontem."

"Então pra isso que você veio. Pena que não foi pra uma visita casual. Pode sentar."

"Não, dessa vez não. E você? Veio passar as festas de fim de ano com a filhota?" 

"Vim e me deparei com a minha filha casada e grávida."

"Também fiquei surpreso, mas ela sabe o que faz. Ela é muito inteligente."

"É sim. E eu tô começando a achar que dessa vez vai vingar."

"Deus te ouça."

"Amém."

Jessica apareceu na sala. 

"Oi, George."

"Oi." O advogado se pôs de pé e olhou para a ruiva, preso numa espécie de transe. 

"Trouxe os documentos pra eu assinar?" 

"Você tá tão grávida."

"Estou."

"Quantos meses?" 

"Seis."

"Eu não vejo você assim desde..."

"Desde que eu era casada com o Bradley. Já sei, já sei. E o documento?" 

"É uma menina, né? Já sabe o nome?" 

"Mel." Paulo respondeu. 

"Mel é..."

"Nome de cachorro, também já sei."

"Eu ia dizer que é um nome adorável."

"Ah. Obrigada."

"Você também tá adorável, tirando esse seu cabelo pingando. Você não tem secador?" 

Jessica pegou o cabelo de lado e torceu de leve.  Paulo riu. 

"Você chegou quando eu ia fazer isso."

"Não posso te entregar o documento com o cabelo assim. Você pode acabar molhando, vai lá secar."

"Ele tem razão." Paulo concordou. 

"Inacreditável." Jessica resmungou e saiu da sala, voltando poucos minutos depois com uma toalha enrolada na cabeça. 

"Posso assinar agora?" 

"Se importa de eu tirar uma foto sua pra guardar pro futuro?" George brincou, fingindo tirar o celular do bolso. 

"Eu não sei a graça que vocês estão vendo." Jessica olhou brava de George a Paulo, que estavam cheios de risinhos. 

"Desculpa. Foi muito não profissional da minha parte rir de uma advogada renomada com uma toalha na cabeça."

Jessica não respondeu e só esperou os dois pararem de rir. "Desculpa, desculpa. Parei. Vou pegar os documentos."

Georgie abriu a pasta e tirou uma pilha de documentos para Jessica assinar. "Divirta-se."

Jessica pegou os documentos na mão e se sentou na mesa horrenda de Bradley para assiná-los. 

"Eu vou precisar também, que você me acompanhe até o fórum. Eles precisam que você assine outra coisa lá. Eu tentei trazer aqui, mas você sabe como são..."

"Hoje?" 

"Sim. Assim que você acabar de assinar esses. Vai ser rápido. Não deve levar mais de uma hora."

"Você me avisa isso agora?" 

"Eles me ligaram hoje de manhã. Também fui pego de surpresa."

"Tudo eles dificultam." Jessica murmurou com raiva. Ela terminou de dar a última assinatura naquela leva e se levantou. "Me dá meia hora?" 

"Pode se arrumar no seu tempo. Vou ficar aqui colocando o papo em dia com o seu pai. Aposto que você tá com as melhores histórias do senado." 

"Eu tenho algumas." Paulo soltou uma risada. 

"Ok. Fica contando essas suas histórias que eu já volto."

Depois de 45 minutos, Jessica saiu pronta do quarto. 

Ela estava usando um vestido, já que nenhum de seus ternos cabiam mais nela.

"Você tá linda."

"Cala a boca. Tchau, pai. Tchau, dinda."

"Tchau, filha." Paulo e Octavia falaram juntos. Eles se entreolharam por um instante de depois viraram a cara. 

"Tchau, Paulo. Foi um prazer revê-lo."

"Igualmente."

"Tchau, Tavinha!" 

"Vão com Deus."

"Gostei muito de ver seu pai. Ele tá muito boa pinta." George disse, enquanto os dois caminhavam até o carro do advogado. 

"Ele também gostou de te ver. Não sei o que ele vê em você."

"Eu sou muito charmoso."

"Aham."

George abriu a porta do carro para Jessica entrar.

"O cinto tá desconfortável?" 

"Tá ótimo."

"E o banco? Vou jogar um pouco pra atrás."

George ajustou o banco. "Tá melhor?"

"Tava bom antes e tá bom agora. Entra logo."

"Certo." 

George fechou a porta do banco do carona e deu a volta para entrar no carro. 

"Desculpa ter te tirado do conforto da sua casa."

"A culpa não foi sua."

"Eu sei, mas mesmo assim."

"Como vai a Rose?" 

"Vai bem. Toda animada pro natal."

"Eu comprei um presente pra ela. Esqueci de te entregar."

"Tudo bem. Ela vai ficar toda animada em saber que vai ganhar outro presente."

"Espero que não desanime quando vir o que é."

"Tenho certeza que não."

Quando os dois chegaram no fórum, George fez questão de deixar o carro primeiro e abrir a porta para a ruiva sair. 

Eles caminharam para dentro do local sendo cumprimentados aqui e ali pelos funcionários.

George mantinha a mão protetoramente nas costas da ruiva. Ele sabia que sua gravidez tinha risco e isso exigia cuidados especiais da sua parte. 

"Senta aqui enquanto eu vejo se podem nos receber."

"Eu posso ir junto."

"Nada disso. Eu já volto."

George desapareceu e Jessica ficou esperando entediada, olhando para as unhas de quando em quando para passar o tempo. 

"A gente vai ter que esperar um pouco." George informou ao retornar. 

"Tudo bem."

"E como é tá casada de novo?" George puxou assunto. 

"Eu queria dizer que estou tirando de letra porque já fui casada antes por anos, mas não seria verdade. Eu tô me acostumando ainda. Parece que tô vivendo tudo pela primeira vez."

"De certa forma você tá. Cada casamento é uma experiência única."

"Sim! É estranho, né?" 

"Mais ou menos." George deu de ombros. "Mas você não acha que se casou cedo demais?" 

"Não."

"Não tô julgando."

"Tá sim."

"Eu só acho que você não conhece esse cara direito."

"Andrew."

"O quê?" 

"O nome desse cara é Andrew."

"Certo. Andrew."

"Eu conheço muito bem o meu marido."

"Então qual é o nome da mãe dele?" 

"É um nome inglês. Não lembro."

"E do pai?" 

"Alguma coisa Benjamin. Eu acho."

"E o aniversário dele?" 

"Do pai do Andrew?" 

"Não, do Andrew."

"6 de outubro."

"De que ano?" 

"Ele tem 46. Então... 74? É, 74!" 

"Signo?" 

"Eu não acredito em signo."

"Mas você sabe o seu."

"Sim, mas não o das pessoas."

"Cor preferida?" 

"Ele nunca falou. Mas ele tem cara de quem gosta de verde."

"Comida favorita."

"Alguma coisa com carne. Ele adora carne."

"Gênero de filme preferido?" 

"Acho que documentário, não, animação."

"Ele tem hipertensão, diabete ou alguna outra doença crônica?" 

"Acho que não. Ele teria me falado se tivesse."

"Estilo de música que mais escuta?" 

"Rock. Essa eu tenho certeza."

"Onde ele fez faculdade?" 

"Em alguma faculdade da Inglaterra. Oxford? Acho que foi. Ele é muito inteligente. Deve ter estudado lá."

"E a pergunta valendo um milhão de reais. O nome do melhor amigo dele."

"Bradley! Ha! Ganhei!" 

"Verdade. Te dei essa de presente."

"Deu nada. Eu só conheço muito o meu marido."

"Uma verdadeira especialista."

"Olha, eu entendo o que você quer dizer." Jessica disse depois de um período de silêncio. "Obviamente eu tenho muita coisa pra perguntar e aprender sobre o meu marido. Mas eu sinto que o principal e o que realmente importa, eu sei. Ele é inteligente, fofo e atencioso. Ele me faz muito feliz e eu o amo. Mesmo tendo esquecido o nome da mãe dele... e do pai...e dos irmãos... um é Matty..."

"E você se afunda cada vez mais." Ele riu. "Eu só quero que você seja mais prudente nas suas decisões futuras. Dito isso, dá pra ver que você tá feliz e eu fico feliz com isso."

"Obrigada."

"Falo isso porque não quero ter que ser seu advogado de divórcio."

"E quem disse que você seria? Você não deixou eu ser a sua."

"E nem você deixou eu ser o seu, no do Bradley."

"Foi vingança, eu sabia!" 

"Não, não foi vingança. Eu só conhecia uma advogada melhor que você."

"Vingança."

"O que fizer você se sentir melhor, Chastain."

"Vingança." Jessica cantarolou. 

"Quer que eu mostre a foto de você com toalha na cabeça?" 

"Você tirou?" 

"Sim e tá bem aqui." George tocou o bolso da calça.

"Filho da ****! Apaga agora!" 

"Eu não. É minha foto preferida sua."

"Apaga se não eu vou falar pra Freda do relações pessoais que você fez você sabe o quê com a Gina do financeiro."

"Chantagista."

"Cadê a foto?" 

"Era mentira."

"Prova."

"Vai ter que acreditar na minha palavra."

"Georgie!" 

"Aqui, sua chata." George entregou o celular na mão da ruiva. 

"De quem é essa bunda?" 

"Frankie. E devolve meu celular." George puxou de volta. 

"Ela tem uma bunda bem... redonda."

"E tem covinhas!" 

"George, aquilo é celulite e não covinhas."

"Sério? Então por que vocês mulheres não querem ter celulite? Achei tão bonitinho, aqueles furinhos na bunda." 

"Você é estranho."

"Pode ser."

George e Jessica continuaram conversando até serem chamados. 

A ruiva assinou o ofício e depois George levou-a de volta para casa. 

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