domingo, 7 de janeiro de 2024

Visita à creche

Jessica estava terminando de colocar a camisa no filho quando seu celular tocou. 

A ruiva estendeu o braço para puxar o celular da cama. “Alô.” Ela falou com o celular preso entre a orelha e o ombro, enquanto passava o outro braço do filho pela manga da camisa. 

“Quem é, mãe?” Theo perguntou. 

Jessica tapou o microfone do celular. “A coordenadora da creche que eu tô tentando colocar a Sadie.” Ela sussurrou para o filho. 

“Por que ela não estuda na escola do papai?” Theo perguntou confuso. 

“Hoje?” Jessica colocou a mão em cima da boca do filho para calá-lo, e ele começou a rir. “Posso. Ah, eu queria saber se vocês conseguem vaga pra mais uma criança? Meu ex-marido tem um filho com a idade parecida da minha, e a gente quer colocar nossos filhos na mesma creche.” A advogada explicou. 

Theo puxou a mão da mãe da boca. “Posso ir junto?”

“Não.” Jessica sussurrou. Ela puxou o filho, prendendo ele entre as suas pernas, e o abraçou com o seu braço livre. Theo encostou a cabeça no tronco da mãe e chupou o dedo. 

“Tudo bem eu falo com ele. Obrigada.” A ruiva fungou a cabeça do filho. “Até mais.” Ela desligou o telefone. 

“Por que eu não posso ir?” Theo perguntou, virando para olhar a mãe. 

“Porque você faz muita bagunça.” Ela apertou o rostinho dele. 

“Não faço não.”

“Aham, não faz não. Você vai ficar aqui com o papai, com a vovó e com seus irmãos. E sem reclamar.”

“Tá bom.” Theo se deu por vencido. 

“E promete que vai respeitar os mais velhos? Principalmente a vovó e o papai?”

“Prometo.”

“Agora dá um beijo na mamãe.” Jessica abaixou a cabeça para o filho conseguir alcançar seu rosto, e Theo beijou sua bochecha. “Que beijo gostoso!” Jessica falou exagerada e Theo riu. 

Ela agarrou o filho e o encheu de beijos. “Chega, mamãe!” Ele disse gargalhando. 

“O que você disse? Não ouvi.” Ela o beijou ainda mais. 

“Mãe!”

“Tá bom, tá bom.” Ela soltou o filho. “Pode ir brincar.”

Theo sorriu e correu para a sala. 

“Sem correr!” Jessica gritou em vão. 

Ela pegou o celular e ligou para o ex-marido. 

“Oi, Jess.” Bradley atendeu. 

“A coordenadora da creche que eu te falei ligou agendando uma visita pra hoje. Eu disse que você também quer colocar seu filho lá e ela disse, que se desse, pra você ir junto, pra ver se a gente consegue vaga para os dois.” Jessica disse, indo direto ao ponto. 

“Essa creche é tão top assim? Tô achando que essa coisa de não ter vaga uma balela.”

“É a melhor creche do Rio. Os bebês escutam Beethoven pra dormir.”

“Isso a gente pode fazer em casa.” Bradley falou não impressionado. 

“Você vai?”

“Vou né. Passo aí que horas?”

“Duas.”

“Tá bom.”

“Não se atrasa.”

E com isso, Jessica encerrou a ligação. 

Às 14 horas, Bradley chegou no prédio da ex. 

“Tudo bem?” Jessica cumprimentou o ex-marido ao entrar no carro, com dois beijos no rosto. 

“Tudo. Olha quem tá dormindo lá atrás.” 

Jessica virou a cabeça e viu o afilhado dormindo no banco detrás. “Awnn… parece um anjinho.”

“É mesmo.” Bradley respondeu orgulhoso. “Agora me conta. Como tão as coisas com o Andrew e a mãe dele?”

“Melhoraram. Ele tá super apegado a mãe. Dá pra ver que esse momento com ela é muito importante pra ele. Provavelmente é um dos últimos também. Eu fico arrasada por ele porque perder o pai ou a mãe é uma das piores coisas que pode acontecer com uma pessoa.”

“Verdade. Você tem que ser forte por ele.”

“Eu sei. Mas eu nunca sei muito o que fazer. Ele tava sensível porque as crianças não tavam dando muita bola pra avó. Mas pra elas, a avó é uma estranha e eu não posso obrigar elas a interagirem com a mãe dele.”

“É uma situação delicada. Tenta conversar com elas de um modo que elas consigam entender que aquilo é importante pro Andrew e que vocês querem ver ele feliz.”

“Eu vou falar. E você?” Jessica encostou a cabeça no banco e virou o rosto para olhá-lo. 

“Tá tudo bem. Só tô bem cansado.”

“Dá pra ver.”

“Obrigado.” O professor de estatística riu. 

“Você me entendeu.”

“Eu sei. Tô brincando. Mas se você tá me achando cansado tem que ver a Elizabeth. Às vezes eu acho que até vai ser bom ela voltar a trabalhar. Cuidar de um bebê 24 horas por dia é muito exaustivo.”

“Verdade. E mesmo quando a gente volta a trabalhar, nossa cabeça tá o tempo todo neles.”

“Exatamente.”

“Eu tô com o coração na mão de voltar a trabalhar esse ano. Eu sinto que as crianças vão acabar se distanciando de mim.”

“Se você voltar no mesmo ritmo de antes, vão mesmo.”

“Pois é.”

“E nossa Emminha? Eu tenho achado ela melhor, e você?”

“Não sei… ela é boa em disfarçar o que sente. Ah, eu falei com o doutor Vandock sobre a pesquisa da nossa Emma, e bem, temos um problema.”

“Qual?”

“Ele precisa de material pra fazer testes, e ver a causa dos abortos espontâneos.”

“Ele vai precisar dos óvulos da Emma.” Bradley tentou adivinhar. 

“Sim. Mas duvido muito que ela aceite. Outra opção seriam os meus, já que o problema que a gente tem é o mesmo.”

“Então resolvido.”

“Mas não é só disso que ele precisa. Ele precisa fecundar o óvulo pra observar e tentar entender o que acontece no meio do caminho que acaba atrapalhando o desenvolvimento dele.”

“Oh.” A ficha do Bradley realmente caiu. “Ele precisa então do esperma de alguém.”

“Sim. E é aí que fica complicado. Ele precisaria que um dos doadores fosse o Andrew, porque já sabemos que uma fecundação nossa dá certo, e ele precisa estudar cada estágio do desenvolvimento do feto pra entender o porquê dá certo, e comparar com a fecundação que dá errado.”

“Só que aí ou vocês teriam que abortar o experimento ou vocês teriam outro filho.” Bradley deduziu. 

“Exato. Andrew e eu acabaríamos tendo outro filho por conta da pesquisa. Mas essa nem é a parte mais complicada.”

“Mais complicada do que vocês tendo outro filho?”

“Lembra que eu falei que ele teria que comparar com uma fecundação que sabemos que dá errado pra entender o que exatamente dá errado pra poder consertar? Então… você teria que ser um doador também.”

“Tudo bem. Pela Emminha eu doaria sem problemas. É até mais fácil pra mim, do que pra você, em termos de colher o material.”

“O problema é que apesar da gente ter praticamente certeza de que o feto não vingaria, sempre tem aquela chance mínima dele acabar vingando, quer dizer, a Emma veio de nós dois, não foi?”

“A gente perdeu 7 filhos, Jessica. Você acha que do nada, só porque era pra ser só um experimento, o bebê ia acabar vingando?”

“Provavelmente não. Mas você acha que nossos cônjuges iam aceitar o risco?”

“E qual é a outra opção?”

“Ele disse que essa é a opção mais eficaz, além da mais rápida e da menos cara. A outra ele teria que achar mulheres com condição parecida com a minha e a da Emma, e oferecer dinheiro pra testar elas. Teriam que ser ao menos umas vintes mulheres, e levaria alguns anos pra chegar a alguma conclusão, e no final, não saberíamos se ajudaria a nossa Emma, de fato. Também envolveria fecundação dos óvulos e provavelmente alguns abortos induzidos, nos fetos que viessem a vingar.”

“Só tem essas duas opções?”

“A princípio sim. Ele falou que vai estudar outros métodos. Talvez tentar fazer os testes com amostras de sangue ou medula óssea. Mas novamente, tiro no escuro que pode não levar a nada, e só fazer a gente gastar milhares de dólares à toa.”

“Que m***a!” Bradley xingou frustrado. 

“Eu sei. Eu não quero que nossa filha passe pelo mesmo pesadelo que eu passei, ou pior. Porque no final, eu consegui ter os meus filhos, mas e ela? Eu não quero que a nossa filha sofra, Bradley. Eu não vou permitir que ela perca outra criança. Não vou.” A ruiva falou enfática. 

“A gente pode procurar outro centro de pesquisa e ver o que eles dizem. O que acha?”

“Concordo. Também tinha pensado nisso.”

Bradley estacionou o carro no estacionamento da creche. 

“Eles não economizaram nenhum pouco na fachada.” O professor comentou impressionado. 

“Espera pra ver como a creche é por dentro.” 

Bradley acabou acordando o filho ao tirá-lo da cadeirinha. 

“Coitadinho. Papai te acordou?” Jessica disse ao bebê chorando no colo de Bradley. 

“Ele odeia que tirem ele do sono dele.”

“Claro. Quem gosta de ser acordado de um soninho gostoso?” Jessica disse falando com o bebê. “Quer vir com a dinda?” Ela acariciou sua barriguinha. 

“Pode pegar.” Bradley entregou o bebê a ex. 

“Oi, meu amor!” Jessica falou com o bebê. “Seu pai é um bruto, não é?”

“Não sou não.” O professor se defendeu. 

“É sim. Tá vendo? Até o Bentinho concorda.” Ela balançou o afilhado no colo para acalmá-lo. “Ele é muito lindo, Bradley. Você e a Elizabeth tão de parabéns.”

“Obrigado. Seus filhos também são lindos, e a Sadie é super engraçadinha.”

“Ela é a minha cara, não é?”

“É sim.” Ele sorriu. 

“E eu não fui um bebê e nem uma criança bonita.”

“Você era fofinha.”

“Aham.” Jessica deu um olhar descrente para o ex, e foi até a entrada da creche. 

“Boa tarde! Eu sou a Valéria, a coordenadora da creche. A Jessica eu já conheço de quando veio visitar com o marido, e você deve ser o Bradley.” Valéria disse com um sorriso amigável no rosto, ao abrir a porta para Bradley e Jessica, estendendo a mão direita para cumprimentá-los. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário