domingo, 25 de outubro de 2020

Arthur

Arthur. Ele tinha os olhos do pai. Duas órbitas de oceano que iluminavam o rosto todo. Ele também tinha sardas. Era difícil fugir disso, todos os seus filhos herdariam suas sardas. O sorriso era dele, com certeza. Aquele sorriso que a tinha feito se apaixonar e dizer sim um milhão de vezes. O nariz, uma mistura dos dois. O cabelo, provavelmente, um loiro escuro para castanho. 

Jessica conseguia imaginar perfeitamente como Arthur seria se ele tivesse nascido. Ela costumava sonhar com ele. Entretanto, nos sonhos, o filho tinha um rosto diferente a cada noite. Nas ruas, todos os meninos por quem passava, eram seu Arthur em diferentes estágios de vida. Às vezes um bebêzinho, às vezes uma criança cheia de energia e, por vezes, um pré-adolescente. 


Sem que seu marido soubesse, a ruiva ia às tardes para o parquinho na companhia de seu crochê e ficava horas observando as crianças brincando. Cada dia ela focava em um menino diferente para ser seu Arthur e sempre era doloroso quando chegava o momento de ir embora, às 16 horas. Tempo suficiente de receber seu marido em casa, sem que ele notasse que estivera ausente a tarde inteira. 

Numa das tardes, quando retornava do parque, uma mulher entrou no elevador com um menino que devia ter uns seis, sete anos. Jessica sorriu para o menino e ele sorriu de volta. 

"Seu filho é uma graça." Jessica comentou para a mulher. 

"Obrigada, mas dá um trabalho!" 

"Sério? Ele parece um anjinho." 

"Esse de anjinho só a cara." A mãe respondeu. "Você conhece alguma babá? Eu to precisando de alguém pra ficar com ele essa sexta." 

"Eu posso tomar conta dele. Eu moro aqui no sexto andar, é só levar ele pra lá." 

"Eu não quero atrapalhar, você deve ter suas coisas pra fazer." 

"Não me atrapalha em nada." 

"Tudo bem então. Eu posso pegar o seu contato?" 

"Claro." As duas trocaram contato e seguiram para seu destino. 

Jessica ficou de babá do menino, uma, duas e depois diversas vezes. Às vezes, quando sua afilhada estava em casa, ela levava os dois para brincarem no parque. 


Bradley estava preocupado com o tempo que a ruiva passava com o menino. Era comum chegar do trabalho e encontrar o menino na sua casa brincando com ela. 


 "Jess, você sabe que ele não é nosso, né?" Bradley perguntou um dia. 

"Claro que eu sei." Ela saiu da sua presença irritada. 
 

Bradley estava preocupado com a saúde mental da sua mulher. Ela já tinha sido afastada dois meses do trabalho por motivos psicológicos e agora parecia obcecada com aquele garoto, agindo como se fosse a mãe dele. Ele precisava tomar uma providência e assim o fez. 

 Bradley foi para a casa dos pais do menino e contou sobre o estado de saúde de sua mulher. Contou que eles tinham perdido um filho há pouco tempo e que sua mulher ainda não havia superado a perda e foi diagnosticada com depressão, e que provavelmente, estava usando o filho deles para substituir o que ela tinha perdido. Os pais do menino foram super compreensíveis e empáticos com a situação do professor e prometeram não deixar mais o garoto com a ruiva. 

 Jessica, entretanto, não entendeu o que tinha feito de errado, assim como, não entendia o porquê de seu Arthur ter sido tomado dela.   



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